sexta-feira, janeiro 27, 2006

Rewind

Às vezes, sem saberes porquê, tudo se desfaz por entre os dedos e assistes atônito e impotente à perda irrecuperável do teu amor: ele desfaz-se em gritos, insultos, tudo se perde no ar que fica pesado como chumbo e, mergulhado na prostração do absurdo, percebes que está tudo perdido, que as palavras e os gestos te atraiçoaram para sempre.
Preferes morrer a enfrentar a realidade por ti criada, alimentada pelos teus medos e dúvidas. Percebes que te fodeste para sempre, que nunca mais poderás recuperar tudo o que construíste, os sonhos estatelaram-se como copos que atiraste à parede e se desfizeram em mil cacos e, de repente vês a tua vida em infinitos fragmentos de vidro iguais a nada, piores que nada, porque o nada é branco e têm um princípio e um sentido mas desaparece quando percebes o que te aconteceu e, os vidros ficam ali no chão à espera de te apanharem num movimento menos prudente. Então vais buscar uma vassoura, daquelas pequenas que parecem de brincar e uma pá a condizer e tentas apanhar os fragmentos infinitos e varres com cuidado, sabendo que atrás da porta, ou junto ao rodapé, ou estranhamente projetado a mais de três metros, há um que te vai cortar mesmo o pé e, por mais que não queiras, por mais que fujas, vais mesmo sofrer.
Ou então, depois da batida da porta que te ecoa no cérebro como uma bomba-relógio com a contagem ao contrário, vais mesmo ao armário e tiras de lá todos os copos, um a um e atira-los contra a parede, o movimento do teu braço é como o de um atleta das olimpíadas a lançar o dardo, apetece-te furar o mundo em mil buracos, o efeito aplástico do vidro é admiravelmente acompanhado por um ruído estridente, um estertor de morte que não consegues realizar, a banda sonora perfeita para a tua alma, ou aquela merda que carregas no peito e que te alimenta e ao mesmo tempo te mata, toda partida, rebentada, desfeita em mil pedaços de memórias que não queres esquecer mas não podes lembrar e, é então que percebes que não és nenhum atleta, que não podes voltar a trás, rebobinar o filme e evitar a conversa, os insultos, os gritos, os gestos desmedidos e absurdos, os maus tratos de quem ama de mais e não sabe viver de outra maneira. E é então que te perguntas porquê.
E os dias passam, comendo a luz que te dói nos olhos e na alma e vêm as noites, e o tempo continua a perseguir-te com o vazio de um dia igual ao outro e ao outro e outro e tu só queres desistir, dormir, perder o juízo, e a lucidez e voltar ao momento exactamente anterior à dor, ao vazio e à tristeza. Mas é sempre tarde, é sempre demasiado tarde para voltar atrás.
Só o mundo é que anda ao contrário dos ponteiros do relógio.

2 comentários:

Arthur Silva disse...

Rather to love and suffer than never to love at all for there's no good times without the bad times and life is made of ups and downs, when you feel all the rage and pain that we all do when that beautifull happy stage passed off like a dream you know that you are in fact alive unlike those that claim they don't want to fall in love for they want not to get hurt... I pitty them...

Alta1r disse...

triste e tão dolorosamente real... :(